sábado, 19 de fevereiro de 2011

Não sei quem sou, que alma tenho...



"Não sei quem sou, que alma tenho.
Quando falo com sinceridade não sei com que sinceridade falo.
Sou variamente outro do que um eu que não sei se existe (se é esses outros)...
Sinto crenças que não tenho.
Enlevam-me ânsias que repudio.
A minha perpétua atenção sobre mim perpetuamente me ponta
traições de alma a um carácter que talvez eu não tenha,
nem ela julga que eu tenho.
Sinto-me múltiplo.
Sou como um quarto com inúmeros espelhos fantásticos
que torcem para reflexões falsas
uma única anterior realidade que não está em nenhuma e está em todas.
Como o panteísta se sente árvore e até a flor,
eu sinto-me vários seres.
Sinto-me viver vidas alheias, em mim, incompletamente,
como se o meu ser participasse de todos os homens,
incompletamente de cada,
por uma suma de não-eus sintetizados num eu postiço."

Fernando Pessoa

2 comentários:

  1. AMEI o texto, amo Fernando Pessoa mas não conhecia esse.
    Pisciana, impaciente, carente e decidida.
    Adoro Clarice Lispector, Jane Austen, e seriados!
    Amo tanto seu blog, q está seguindo e quer muito que você conheça o dela!
    Paula te adorei,assim de longe!!
    Beijos!!
    http://ideiaoquadrado.blogspot.com/
    @WelenMedeiros

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  2. Que lindo e gótico ao mesmo tempo ainda não tinha visto esse do Fernando Pessoa. Adorei!
    Beijos.

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